Por Roque Peixoto
Fiquei perplexo e confuso, nos últimos
dias, transitando pelas ruas de Salvador, ao ver ao longo da Avenida Tancredo
Neves uma peça publicitária intitulada “NegaLôra”, fazendo uma referência à “cantora”
Cláudia Leitte e ao seu show “beneficente”.
Como não sou muito de acompanhar
os bastidores da cultura da Bahia, fui procurar entender o que estava
acontecendo. A princípio, achei que já era o fim do mundo e 2012 tinha sido
antecipado para o dia 12 de dezembro (dia em que vi a referida publicidade). Na
verdade se trata de uma jogada de marketing a partir de um nome de batismo dado
pelo “grande” músico baiano Carlinhos Brown.
É legítimo que artistas, músicos
e musicistas se esforcem para entrar em mercados internacionais, como Estados
Unidos e Europa. Mas através da apropriação indevida da identidade de um povo
que sofre até os dias de hoje para garantir a sua visibilidade e combater o
racismo, não é admissível.
Quando a cantora CL utiliza o
termo NegaLôra como sua “nova” identidade de marketing, visa também, agregar
valor ao seu produto. Esse movimento poderia ser entendido como algo positivo
se não tivesse como ponto de fundo ressuscitar o “mito da democracia racial” que tanto foi responsável pelo aprofundamento
sutil e velado do racismo no Brasil.
Sabe-se que a Cláudia Leitte não
emplacou, mesmo sendo somente a “Lora” da música baiana, depois do rompimento com
a banda Babado Novo. E mesmo se apropriando da música negra da Bahia, não
avançou na mídia para além de protagonizar polêmicas em torno do teu pujante
desejo de se parecer com a Ivete Sangallo, outra usurpadora da nossa identidade
afro-baiana.
Quando a Daniela Mercury se
apropriou das músicas do Bloco Afro Ilê Aiyê, muitos de nós já denunciávamos
que se iniciava um processo de apropriação indevida dos nossos símbolos. E a
consumação do fato se deu quando a mesma disse em auto e bom som: “a cor dessa cidade sou eu” (ela,
Daniela M.?).
Se é pra ser a cor da cidade, que
sejam Margareth Menezes, Will Carvalho, Mariene de Castro, Vigínia Rodrigues, e
todas as outras lindas vozes da “NegaNegras” desta cidade de todos os Orishás.
Se a CL quer agregar valor e
afirmar uma identidade (que não é dela) para vender seu produto, compreendo,
mas não tolero. Hoje NegaLôra, amanhã o que será? Vamos exaltar nossas
NegaNegras com suas vozes baianas cheias de africanidades.
Quanto ao Carlinhos Brown, é a
prova que ainda temos muitos capitães do mato pra apavorar por aí!!!